15/01/2015 – A criação de Lição de Anatomia – Parte IV

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A Capa de “Lição de Anatomia”

Quando o anúncio de que Brasiliana Steampunk havia vencido o concurso da Fantasy/Casa da Palavra foi feito, no dia 16 de junho de 2014 – lembro do dia pois estava comemorando o Bloomsday com alguns amigos, o que significa beber, conversar alto e ler poesia no microfone no bar Ponto de Cinema, em Santa Maria – meu grande entusiasmo foi acrescido de imensa apreensão, findando apenas no dia 31 de agosto, quando o livro foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo.

Todos sabemos que um livro – por mais que se possa falar de suas ideias, de suas abstrações conceituais, das motivações psicológicas que levaram à sua escrita – é também um produto e como qualquer produto pode ou não chamar a atenção do público. E neste quesito, tanto a capa quanto a diagramação são fatores essenciais para se conseguir não apenas chamar a atenção para o produto em si como também para o seu conteúdo.

Nos primeiros diálogos com Affonso Solano sobre a capa, ele defendeu o nome de Rodney Buchemi, artista mineiro que tem em seu currículo trabalhos tanto para Marvel quanto para a DC Comics. Do ponto de vista de Solano, a escolha de um artista com experiência em quadrinhos daria ao projeto gráfico de Brasiliana Steampunk uma dimensão mais “super-heróica”, um elemento que na sua opinião seria fundamental ao sucesso do livro.

Até hoje, quando me perguntam sobre o gênero de “Lição de Anatomia”, fico na dúvida sobre a resposta que devo dar, uma vez que o livro é muita coisa: é uma história de ficção científica steampunk; é também uma história de suspense e horror psicológico – em especial se pensarmos nos crimes de Louison e na Camarilha da Dor; mas também apresenta um universo no qual os heróis da literatura brasileira formam essa “liga extraordinária” disfarçada de “sociedade secreta”. Em função disso, minha principal dúvida estava em como comunicar esses três elementos numa capa?

Do alto de minha inexperiência, pensava que seria necessária escolher apenas um desses elementos e ignorar os outros dois, o que levaria o livro a correr o risco de atrair apenas um tipo de público. E aqui, novamente, entram os talentos de Solano e Buchemi.

Em trocas de e-mails com Solano, sugeri alguns personagens e enviei longas descrições dos heróis que pensava como fundamentais à cara do livro. É claro que queria todo o elenco, o que significa entulhar a capa com mais de vinte personagens. Pacientemente Solano explicou-me que usaríamos apenas quatro, dois masculinos e dois femininos, além de um elemento que comunicasse a dimensão retrofuturista do cenário. Depois de lamentar um pouco, acordamos que esses seriam Louison como figura ameaçadora central, Vitória Acauã, Rita Baiana ou Beatriz e Pedro Britto Cândido.

Deste primeiro diálogo, Buchemi pensou em cinco propostas, sendo que cada uma delas privilegiava aspectos diferentes do universo de Brasiliana Steampunk e seus moradores.

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Eu particularmente gostei de todas elas, apesar de ter uma predileção pela primeira proposta e a última. A primeira tinha uma perspectiva que indicava perigo e urgência, além robôs e zepelins – e claro que teria adorado uma capa com um zepelim! Apenas alertei para a posição da personagem feminina que estava abraçada a Pedro Cândido na última opção. Escrevi a Solano que a capa estava bonita, mas que não havia “mocinhas em perigo” em Brasiliana Steampunk; quanto muito, “mocinhos em perigo”.

Mais uma vez, Solano e Buchemi compreenderam e respeitaram meu pedido, com sua delicadeza e profissionalismo costumeiros.  A partir destes últimos ajustes, Buchemi chegou à última proposta de Layout no exato momento em que o prazo estava esgotando. Na versão final, os zepelins foram substituídos pelos robóticos e Beatriz foi substituída por Rita Baiana.

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Eu tinha ainda duas considerações. Achava o bigode de Louison bem estranho, em especial ao pensar naquele ideal de vilão mais charmoso do que ameaçador e as cores muito vivas, um pouco distantes daquilo que os tons mais chapados e cobreados do Steampunk mereceriam.

Solano explicou-me que o Louison da capa correspondia não ao “Louison” que eu tinha em minha cabeça ou mesmo ao “Louison” mais charmoso e refinado presente no texto e sim ao “Estripador da Perdição”, ao “Mefistófeles Tupiniquim”, ao “Terrível Diabo”, ao “Alcaide Infernal”, entre outras nomenclaturas, que os jornais da capital deram ao doutor quando ele foi preso. Ademais, tal “interpretação” correspondia também à leitura que Buchemi havia feito e que o divertido do processo era justamente isso: ver meus personagens ganharem vida a partir de outras interpretações. Quanto às cores, disse-me ele que deveria também esperar, pois agora entraria em cena Rico Bacellar, designer que seria o responsável pela capa e pelo projeto gráfico de “Lição de Anatomia”.

Qual não foi minha surpresa quando, num final de semana de férias, recebo a versão final da capa do primeiro volume de Brasiliana Steampunk. As cores e o “desgaste” steampunk estavam lá. A natureza pulp da história se fazia presente na fonte, no título e também na maravilhosa logomarca criada por Bacellar para a série, em forma de um relógio que não apenas me lembravam as engrenagens do universo steam como também o inesquecível relógio de Watchmen, de Alan Moore – uma das minhas principais fontes de inspirações sempre.

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O que aprendi com a feitura do livro – do ponto em que o resultado do concurso foi anunciado até a sua publicação – foi o quanto se ganha com um trabalho afinado e profissional, não apenas dos três artistas citados – Solano, Buchemi e Bacellar – como também de toda a equipe da Casa da Palavra/LeYa.

Nos eventos que participei para a divulgação e lançamento do romance – entre eles a própria Bienal bem como a Comic Con Experience, também em São Paulo – foram diversos os comentários elogiosos à arte e ao quanto Brasiliana Steampunk é um “livro que vende pela capa”. De minha parte, além da óbvia alegria de ver meu livro tão bem apresentado, fica a expectativa de que o seu conteúdo faça também jus a todos esses elogios.

Um abraço a todos vocês

Enéias Tavares

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